15 novembro 2007

Literatura em Português no feminino



(Tudo começa em Lisboa, a cidade das coisas insólitas.) Uma criada negra de um hotel luxuoso para senhores de fraque conversa encostada à porta num intervalo de pano com detergente que incomoda o nariz. O homem instalado no hotel ouve-a falar: «A chuva, ouvi dizer que foi por causa da chuva». A estória com cheiro a balde de lavar escadas era sobre a seca que não parava na terra distante da empregada, onde se dizia que havia uma mulher que tinha prendido a chuva. «Pela manhã vieram os velhos (continuava) e todos ouviram: aquela mulher prendeu a chuva». Então mandaram chamar o feiticeiro, que levou a mulher para uma cabana, fez amor com ela e depois trouxe-a morta nos braços. Ao fim de sete minutos de estória escondida por detrás da porta, o senhor do hotel escutador de conversas alheias soube do fim do relato alucinante: «o feiticeiro deitou a mulher morta na terra e todos caminharam em silêncio. E então começou a chover». O homem, que era viajado, pensou um pouco e chegou à conclusão de que o problema não poderia estar no que acabara de ouvir por engano, o problema estava sem dúvida em Lisboa, «que não era provavelmente um lugar normal», se por ventura ousasse contar isto a alguém.
(...)
Pelas folhas fora continuam também outros contos que ao todo são 14 e que partem da vida quotidiana, até que desembocam num mar peripécias que engole em ondas o onírico, o fantástico, o terrível e o absurdo, o humano em si. E tudo isto pode morar na mesma página. Ou não. Depende do tamanho das marés. E de se chove muito.

Obrigada por este presente Mozahir... e beijinhos de Lisboa até Belo Horizonte! :)

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